Com o mercado aquecido e a falta de mão de obra qualificada sendo apontada como problema por mais de 70% das construtoras, é preciso ser eficiente. Ao mesmo tempo, não se pode abdicar da sustentabilidade, que, de certo modo, acompanha a necessidade de inovações. Foi o que mostraram especialistas em debate durante a Construsummit 2024, em realização nesta semana em Florianópolis (SC). Para eles, esse cenário coloca a cadeia de suprimentos em um novo grau de importância dentro das construtoras, principalmente no que tange a responsabilidade de acompanhar as inovações.
O supply chain de inovações
Carlos Henrique Mattar, diretor executivo de vendas técnicas da Saint Gobain, disse que a empresa, que gera aproximadamente 2 bilhões de euros em vendas anuais em cerca de 75 países, e tem notado mudanças no comportamento do consumidor, o que a motiva a desenvolver soluções para acompanhar as tendências. “Hoje, um em cada quatro produtos que vendemos, não existia há cinco anos”, exemplifica.
No Brasil, a empresa conta com um centro de pesquisa em Capivari, no interior de São Paulo, onde realiza essas ações.
A demanda por inovação, segundo Mattar, tem como pano de fundo a necessidade de atender ao mercado crescente, mas também para mitigar a realidade dos dados demográficos, que mostram que cada vez menos pessoas tem interesse em trabalhar na construção civil.
Entre os jovens de 14 a 29 anos (majoritariamente geração Z), por exemplo, caiu de um nível de oferta de profissionais para o setor de 31 (entre 100) para 19, no período entre 2013 e 2024. “Ao mesmo tempo que inovamos, portanto, precisamos entender o que motiva essa geração mais jovem e voltar a atraí-la para um novo setor da construção”, pontua Mattar.
Na parte de inovação da Saint Gobain, a Nextera, uma startup criada dentro do grupo, tem evoluído e vem alcançando taxa de crescimento entre 40% e 50% anualmente, com o desenvolvimento de sistemas que promovem construções mais leves, rápidas e com menor desperdício. “A abordagem inclui assessoria comercial e técnica, além de monitoramento de obras”, disse.
Os impactos ambientais também são levados em conta, como evidenciado por gráficos que mostram a redução de emissões por meio do uso de tecnologias industrializadas. Um exemplo é a comparação de blocos/tijolos com drywall interno. Esse segundo material revela uma redução de 28,4% no GWP (Potencial de Aquecimento Global).
Concreto com PVC e outras soluções
Rogério Costa, diretor de crescimento e inovação da Unipar, explora um conceito modular de construção que parte do princípio industrializado para construção seca, mas é diferente do drywall.
O Sistema Construtivo Concreto-PVC, como é chamado, consiste em perfis fabricados por meio de um processo de extrusão que mantém a fundação, mas simplifica a construção de paredes, acabamentos e instalações elétricas e hidráulicas.
A Unipar é um player da indústria química, principalmente na produção de cloro e solda, mas também se destaca na produção de PVC (policloreto de vinila), com unidades fabris em Cubatão, Santo André e Argentina, além de uma nova planta que deve ser inaugurada na Bahia ainda neste ano. “O nosso sistema construtivo integra PVC e concreto, permitindo uma redução significativa das etapas de obra, de oito para três”, disse o executivo.
Segundo Costa, isso resulta em redução de 30% na mão de obra necessária e 27% no consumo de materiais, uma vez que evita desperdícios. “Além disso, em termos de eficiência energética e uso da água, alcançamos metas de economia de até 75%”, aponta, enfatizando que, além desses benefícios, esse tipo de obra não gera entulho.
O custo do sistema da Unipar varia entre R$ 2,2 mil e R$ 2,5 mil por metro quadrado, dependendo da localização da obra, e abrange residências sociais, empreendimentos comerciais, escolas e hospitais. O diferencial desse modelo em comparação ao drywall, é que o preenchimento de concreto tira a sensação de oco, segundo Costa.
Suprimentos como roteador da inovação e sustentabilidade
Diante das inovações da Unipar e Saint Gobain, Paulo Eduardo Hoppe, diretor executivo na Hoppe Ribeiro, questiona como os departamentos de suprimentos das construtoras podem levar soluções mais estratégicas para as empresas.
Victor de Almeida, da área de suprimentos da Construtora Pacaembu, avaliou que, antes visto apenas como um setor de compras, agora o supply chain assume papel central para a evolução das empresas, justamente pela sua natureza de poder estar próximo às diferentes soluções apresentadas no mercado. “A inovação, as práticas ESG e a eficiência operacional estão cada vez mais interligadas à cadeia de suprimentos, portanto”, disse.
Pontuando que a indústria da construção é, historicamente, mais lenta para adotar mudanças, ele Almeida vê hoje um cenário no qual novos métodos construtivos e de gestão estão acelerando. “E estamos entendendo que quanto mais inovações, maior a competição”, disse.
A regulação também acompanha esse contexto, acrescentou Costa, da Unipar. Para ele, não se trata apenas de normas técnicas, mas também de questões ambientais e sociais. “Os produtos que estão alinhados aos anseios da sociedade poderão ser destacados”, disse. “Assim, quem não se adaptar às mudanças e não se conectar à cadeia de fornecimento, tende a ficar para trás”, completou.
Carlos Mattar, da Saint-Gobain, refletiu sobre a importância do olhar para o ciclo completo da cadeia de valor. “Analisamos precisamente fatores como a questão acústica e térmica que, além de oferecer conforto, reduz o consumo de ar condicionado. E o fato de nossos materiais serem mais leves também contribui para a redução de custos e emissões durante o transporte”, ressalta.
Para ele, é esse olhar holístico que demonstrará ao mercado – até o consumidor final – as vantagens de construções mais industrializadas. “Precisamos parar de olhar para o pontual e começar a observar o impacto total da nossa atuação”, concluiu.