BIM em infra não precisa ficar restrita a projeto

Por Marcus Granadeiro – 07.10.2016 –

Os recursos do Building Information Modeling podem ser usados em outras fases como operação e descomissionamento, segundo especialista na tecnologia. Para ele, BIM precisa “sair do papel”.

Quando se aborda o conceito BIM (Building Information Modeling), normalmente se vê um ciclo completo, que inicia nas fases de viabilidade e estudos iniciais, passa por todas as fases de projeto, incluindo obra, comissionamento, operação com suas demandas de manutenção, eventuais reformas e ampliações e, por fim, encerra com o descomissionamento, sempre com realimentação de informações do ciclo.

Embora seja um processo cíclico e não exista uma obrigatoriedade do BIM nascer na fase inicial, a grande maioria das aplicações práticas, discussões e projetos de implantação de BIM ficam restritas às fases de projeto. Há poucos casos de uso do BIM em obra, gerenciamento e operação, ou seja, seu uso no campo.

Qual seria o motivo? Talvez pela comum confusão sobre o conceito BIM ser software ou processo, ou porque BIM está muito relacionado com computadores e TI, assim como a atividade de projetar atualmente está. O fato é que ficar limitado a esta etapa ou pensar que é necessário esperar ter o conceito consolidado nesta etapa para explorá-lo nas demais é um verdadeiro desperdício de oportunidade.

O mundo ideal é o BIM permear todo o ciclo de vida, mas não precisa ser assim. Nas fases iniciais de adoção, quando conceitos e domínios de softwares e ferramentas ainda não estão plenos, pensar em modelos distintos para distintas operações e fases não é algo ruim. O modelo usado para compatibilizar pode ser que não seja o ideal para o planejamento, que pode não ser adequado para a operação.

Na fase de operação, podemos pensar no BIM aplicado em barragens de terra. A demanda por monitorar e operar adequadamente estas barragens ficou mais clara após o rompimento da barragem em Minas Gerais. Hoje este monitoramento é realizado através de equipamentos e sensores colocados na barragem, as leituras são coletadas e organizadas, há um processamento e uma análise, mas não é realizada em BIM.

Um passo seria fazer o modelo BIM da barragem, com todas as suas camadas, atribuindo a elas suas propriedades geotécnicas, representar o nível d’água real, gráficos das tensões, armazenar com sua respectiva posição geométrica os dados dos sensores, incluir a barragem dentro do contexto da bacia e da represa que ela forma eindicar locais de presença de pessoas, que são monitoradas em tempo real pela localização do sinal de seu telefone, entre outros Trata-se de um modelo vivo para apoiar a equipe de operação, seja para tomar decisões e corretamente documentá-las, seja para auxiliar nos eventuais planos de evacuação.

Há outros exemplos. O uso do BIM para gerir entregas de unidade, o processo de manutenção de garantias ou, até mesmo, como ambiente para armazenar dados para a operação e registro do seu histórico. Um exemplo interessante de aplicação que independe de um projeto feito em BIM é o descomissionamento, com objetivo de reduzir o impacto no meio ambiente. Este inclusive é real e já usado no Japão para desativar usinas atômicas depois do acidente de Fukushima. O material retirado é radioativo e precisa ser armazenado em contêineres enterrados, ou seja, segregado em função do grau de radioatividade medido. Assim, o modelo “BIM radioativo” é gerado e usado no plano de descomissionamento.

O caso mais grave e comum, no entanto, acontece nas locações e validações de obra, principalmente quando se tem um projeto feito em BIM. Embora o projeto esteja em BIM e desenvolvido com o que há de mais moderno, se vê a obra sendo construída com papel, piquetes de madeira, linhas e com estações totais antigas sem nenhum tipo de integração com o modelo. Toda a inteligência, clareza e precisão do projeto BIM é rebaixada para um desenho 2D e a construção se faz com a velocidade, custo e qualidade de uma época analógica.

O BIM precisa “sair do papel”, sair do ambiente de projeto. Ter BIM em projeto é importante, fundamental, mas ficar restrito a ele diminuiu o potencial  do BIM, reduz seu valor. O investidor que foi encantado com o discurso conceitual se decepciona e é este o principal erro dos projetos de BIM no Brasil. O BIM precisa ir para a vida real.

*Marcus Granadeiro é engenheiro civil pela USP e presidente da Construtivo.