BNDES reduz papel, mas continua importante em infraestrutura

Por Nelson Valêncio – 13.09.2017 –

Especialistas discutiram o novo cenário de financiamento no 15 Fórum Latino-americano de infraestrutura, que começou ontem em São Paulo

Mediado por Marcelo Allain, consultor estratégico do CG/LA Infrastructure, organizadora do evento, um time de cinco profissionais, defendeu um cenário onde o BNDES continua sendo um ator importante, mas agora não o único protagonista em financiamento de projetos de infraestrutura no Brasil. “Nos últimos três anos tivemos dois cisnes negros no país, o que é uma ocorrência rara”, disse Allain, abrindo o tom de discussão. Segundo ele, as “duas aves”, que nessa acepção significam acontecimentos improváveis na teoria do escritor Nassim Taleb (A Lógica do Cisne Negro), foram a queda brutal do PIB (10% em dois anos) e os desdobramentos da Operação Lava Jato. O encontro desses dois acontecimentos fez com que projetos de infraestrutura que eram viáveis em 2013, quando foram concebidos, não tinham mais uma pegada para financiamento em 2016.

A desaceleração no financiamento de projetos de infraestrutura e a paralisação de grandes grupos envolvidos na Laja Jato trouxeram um novo ambiente, ainda mais modificado com a recente adoção de uma nova taxa de juros do BNDES. Por outro lado, Allain destaca que a adoção mais ativa de novas modalidades, como a emissão de debêntures de infraestrutura, e a participação de novos agentes financiadores são resultados positivos da crise. E, nesse ponto, entra o BNDES com uma nova função.

Luciene Machado, diretora da divisão de Infraestrutura do banco, reforça o papel estruturador do BNDES. De acordo com ela, a instituição continua forte como financiador no setor, mas não mais isolado. “Um dos papéis é ancorar os projetos, ampliando a participação de outros atores, não só de financiamento como em relação aos próprios investidores”, defende a executiva. “Um desses papéis é mostrar que o projeto está bem estruturado, que para de pé do ponto de vista de viabilidade”, completa. Luciene lembra que o banco tem ativos bilionários no segmento e uma experiência considerável em infraestrutura, mas que não faz mais sentido que o BNDES participe de forma isolada com 70% a 90% do investimento de capital (capex). “É bom ter olhos adicionais, avaliando riscos e compartilhando análises”, argumentou. Sobre a nova taxa de juros que entra em ação em janeiro de 2018, Luciene avalia que ela de fato é adequada aos projetos de longo prazo e cita o setor de energia como um exemplo de aplicabilidade real do novo modelo.

A visão dos bancos também foi passada por Luiz Giacomini, executivo do Banco do Brasil focado em financiamento para o setor de infraestrutura. “Tem que haver a previsibilidade, como está acontecendo com o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), do governo federal”, disse. De acordo com ele, a economia começa a viver um momento interessante, com a volta do crescimento do PIB e uma taxa de juros mais reduzida. “Os problemas em projetos de infraestrutura sempre acontecem, mas o Brasil é um país emergente e tem atratividade”, complemente, lembrando que o próprio Banco do Brasil teria uma carteira de cerca de R$ 100 bilhões alocada no setor.

Marcelo Schwarz, especialista da S&P Global Ratings, concorda que Brasil tem um potencial para investimentos em infraestrutura, considerando que somente na América Latina está atrás de países como Chile e mesmo do México. “A indústria de fundos de investimento tem quase R$ 4 trilhões de patrimônio, fora o volume dos fundos de pensão”, destacou, indicando como prováveis fontes de dinheiro para projetos no setor. Para ele, o novo papel de estruturador do BNDES pode ajudar na mitigação de riscos e facilitar que os capitais existentes migrem para empreendimentos em áreas como rodovias, portos, saneamento e outros.

José Virgílio, da Machado Meyer e Associados, e Vinicius Fonseca, da LRI Advogados, fecharam o debate, analisando o quadro atual do ponto de vista jurídico. “Temos que ter segurança jurídica e parceria entre o estado e o empreendedor”, resumiu Fonseca. Ele lembrou que o capital internacional – agora na mira do setor – não se resume às agências de financiamento, mas envolvem também os operadores estrangeiros que vão assumir aeroportos, usinas hidrelétricas e outros empreendimentos.