Pós-vendas torna-se o fiel da balança no setor de equipamentos

Por Rodrigo Conceição Santos – 04.04.2016 –

Especial: Fornecimento de peças e serviços já representa de 30% a 40% do faturamento de fabricantes e dealers e se comprova indispensável para a operação salutar nesse mercado.

Foto do banco de imagens Caterpillar
Foto do banco de imagens Caterpillar

No fim de 2005, o mercado brasileiro registrava o consumo aproximado de 5 mil equipamentos pesados de construção e mineração ao ano. Em 2013, no auge e já com a aferição da Sobratema, o consumo foi sete vezes maior, chegando a 35,6 mil unidades. Em 2014 iniciou uma acomodação, ou queda (a interpretação é livre), e em 2015 os agentes desse setor viram os números mais conservadores da década, compilados na venda de pouco mais de 16,8 mil máquinas. Independente da linha de interpretação, contudo, fato é que temos um mercado de menos da metade do de 2013, mas que é o triplo do de 2005, quando começou a pujança do setor da infraestrutura. Nesses dez anos, a evolução do setor atraiu fabricantes de competitividade global, que anunciaram a intenção de produzir localmente para aproveitar as condições de vendas nacionais pelo BNDES, fomentando um primeiro aspecto positivo para fortalecer a cadeia de pós-vendas.

Foram os casos da John Deere, JCB, Hyundai, XCMG, Sany e Doosan. As quatro primeiras concluíram seus planos e continuam operando. A Sany não construiu a fábrica que anunciava em Jacareí (SP) e manteve a produção de alguns modelos numa unidade fabril menor, em São José dos Campos (SP). Já a Doosan, construiu, inaugurou, operou e depois fechou a fábrica também construída no interior paulista.

As marcas que já tinham operação local também se animaram e ampliaram suas produções, como a Case, Caterpillar, New Holland e Volvo, fomentando um mercado bastante competitivo e acostumado ao padrão elevado de consumo da década de ouro para esse setor. Hoje, no período de baixas vendas, elas precisam diversificar o leque de faturamento e usam várias estratégias, como vendas para setores diferentes, como o agropecuário e novas formas de crédito, como os consórcios e financiamentos pelos bancos das próprias fabricantes. Mas efetivo mesmo, tem sido as vendas de peças e serviços, compondo uma divisão de negócios que se tornou o fiel da balança no setor de equipaementos pesados.

Na Bauko, que distribui Komatsu e Atlas Copco nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e no Sul da Bahia, por exemplo, o setor de pós-vendas representou 41% do faturamento em 2015.

Pós venda 1Na BMC-Hyundai, a representatividade não foi calculada, mas, enquanto o mercado de equipamentos caiu 58% de 2014 para 2015, a empresa computou queda de 35% no período, o que significa que a empresa sofreu 23% menos que o mercado no geral. “E esse equilíbrio foi proporcionado pelas ações de pós-vendas”, pontua Felipe Cavalieri, presidente da BMC-Hyundai. Esse departamento, diz ele, fechou o ano com 47% de crescimento.

Alcides Guimarães, diretor nacional de pós-vendas da companhia, explica que o resultado é reflexo de uma série de ações que já vinham sendo tomadas, como o aumento dos pontos de cobertura no país e investimentos em estoque de peças e ampliação das equipes de atendimento. “Hoje, atendemos 90% dos chamados dos clientes em até 24 horas”, diz.

O setor de peças da Case Construction Equipment também cresceu, segundo Henrique Sá, gerente dessa divisão da empresa. O incremento foi de 10% sobre o ano anterior, algo que ele considera bastante significativo tendo em vista o mal desempenho da economia como um todo.

Crise aumenta representatividade de peças e serviços na Bauko
Na Case CE, setor de peças cresceu em 2014 e ficou estável em 2015
JCB usa estruturas recentes para suportar o crescimento do pós-vendas

Cadeia de Fornecimento
Os resultados positivos apresentados nessas divisões, são, para os 14 especialistas consultados por esta reportagem de InfraROI, consequências do crescimento do setor de máquinas nos últimos anos. Isso teria elevado igualmente o mercado de insumos para pós-vendas, fazendo com que os fabricantes de componentes buscassem novos investimentos. “Soma-se a isso o fato de o governo, através do BNDES, ter criado as regras do Finame, levando ao aumento do índice de peças nacionalizadas usadas na fabricação de equipamentos”, diz Fernando Gaya, diretor de peças da New Holland Construtcion. Assim, completa, o mercado de peças e serviços também ganhou desafios de produtividade, exigindo melhor logística de entrega para disponibilidade imediata de itens em todo o país.

Foto do banco de imagens internacional da JCB
Foto do banco de imagens internacional da JCB

O amadurecimento dos fabricantes e fornecedores de peças proporcionou melhores condições de negociação para os fabricantes, que agora podem barganhar para comprar insumos mais baratos e transformar isso em margem de lucratividade e negociação com os clientes finais. “Além disso, o maior número de fabricantes de peças de reposição no Brasil possibilita melhor logística para a produção”, acrescenta Anastácio Souza, gerente de peças da JCB do Brasil.

Um exemplo do amadurecimento desse mercado vem da ZF, que inaugurou recentemente uma unidade de produção de engrenagens em Sorocaba (SP). Os insumos produzidos lá são fornecidos, por exemplo, para os eixos das novas retroescavadeiras da Caterpillar (série F2), onde representam 6% do conteúdo nacional do equipamento. “O Brasil tem hoje maior volume de tecnologias específicas, como as de engrenagens, necessárias para a produção dos eixos. Isso nos permite ampliar a nacionalização, algo que é bom em vários sentidos, como agilidade no fornecimento, redução de estoque interno, etc.”, diz Odair Renosto, presidente da Caterpillar Brasil.

A Pesa, que revende Caterpillar na região Sul do Brasil, atesta a avaliação da fabricante com a qual trabalha e mede que os negócios de peças e serviços já respondem por 30% do seu faturamento anual. “Para atender essa demanda, temos uma estrutura de 35 colaboradores, sendo três deles dedicados à analises de compras de peças”, diz João Marcelo Ferreira, responsável por esse departamento na empresa.

Roberto Marques, líder da divisão de construção e florestal da John Deere, avaliza que a vinda de fabricantes de insumos para equipamentos é um facilitador no relacionamento entre as montadoras e seus fornecedores. “Outro benefício desse cenário é a adequação dos componentes às características da operação local dos equipamentos”, enfatiza ele.

Machado afiado

Roberto Marques, da John Deere
Roberto Marques, da John Deere

O sucesso do pós-vendas nos fabricantes e distribuidores de equipamentos é resultado de investidas constantes no departamento e também da conjuntura do setor de infraestrutura. Anualmente, as montadoras aportaram nesse segmento, com a intenção de ganhar negócios ao demonstrar aos clientes maior capacidade de suportá-los em campo. E esses investimentos estão sendo colocados à prova agora, momento no qual os frotistas não estão comprando para renovar suas frotas e precisam manter os equipamentos usados operando com alto nível de produtividade, o que exige manutenção afinada.

A John Deere mostra estar com o “machado afiado” e a prova disso seria o investimento de 13 milhões de dólares, aplicados no ano passado, para ampliar a capacidade de armazenamento do seu centro de distribuição de peças. Hoje, essa estrutura tem 74,5 mil m² e abastece 20 pontos de vendas espalhados pelo país. “O CD está em Campinas (SP), uma região estratégica próxima a rodovias e ao maior aeroporto de cargas do Brasil, Viracopos. Isso garante uma agilidade imensa para reposição de peças em qualquer lugar do Brasil”, diz Roberto Marques.

O mesmo fez a JCB, que investiu R$ 350 milhões na construção da fábrica nacional em Sorocaba (SP) em 2012 já prevendo um centro de distribuição avançado, com 6 mil m² e mais de 20 mil itens em estoque. “O nosso CD está integrado à logística de operação fabril, proporcionando ganho de produtividade e dinamismo no processo”, diz Anastácio Souza, gerente de peças da empresa. “Investimos recentemente também num sistema moderno de gestão de peças, que trouxe melhoria no gerenciamento do estoque e aumento da disponibilidade de peças para a nossa rede de distribuidores”, completa.

Com essa estrutura, a JCB alcançou a disponibilidade de 96% de peças de alto, médio e baixo giro para atender equipamentos da marca em campo. “Classificamos peças de baixo giro aquelas que possuem movimento, no máximo, uma vez no ano”, explica ele.

Estoque classificado
Assim como a JCB, os demais fabricantes e dealers sabem que a classificação do tipo de peça de acordo com a sua demanda é estratégica para o controle do estoque e o consequente pronto-atendimento aos frotistas. “O nosso sistema classifica atualmente que 60% dos itens são de alto giro, 35% de médio giro e 5% de baixo giro”, diz Fernando Gaya. Entre as peças de alto giro, os exemplos são filtros, rolamentos, sensores e mangueiras.

José Fonseca, gerente comercial da Caterpillar para o segmento de construção, completa que os itens de baixo giro, como motor e transmissão, podem ser requeridas até mesmo sob demanda, e essa classificação inclui fatores como quantidade do inventário do estoque e report de demandas.

Henrique Sá, da Case
Henrique Sá, da Case
Fernando Gaya, da New Holland Construction
Fernando Gaya, da New Holland Construction

Na Case, que tem a mesma classificação de peças de alto, médio ou baixo giro da New Holland, o atendimento ainda leva em conta duas situações: máquina parada no campo de operação ou máquina no pátio. As que estão na primeira situação, segundo Relton César, coordenador de serviços da empresa, têm prioridade. “Na verdade, trabalhamos com diferentes tipos de pedidos e diferentes prazos de entrega. Por exemplo: os pedidos programados têm maior prazo de entrega e os pedidos de emergência – que se referem a situações nas quais as máquinas estão paradas em campo – são tratados com urgência”, diz.

Para esse último tipo de pedido, acrescenta César, existe um programa de fábrica chamado break down assistance, no qual o tempo de atendimento é monitorado minuto a minuto. “E isso vale tanto para pedido de peças quanto de assistência técnica, que é quando o nosso concessionário precisa de uma informação para a solução do problema”, completa o especialista da Case.

Telemetria
A manutenção moderna usa tecnologias de comunicação máquina-máquina (M2M) como apoio, conforme adiantou a Case. Em alguns casos, como na Caterpillar, o histórico de ocorrências ajudou a criar sistemas para avaliar oportunidades de melhoria de produtos ou de processos, envolvendo os revendedores e a própria fabricante. “Em uma das tecnologias, chamada Partners in Quality, os revendedores reportam casos relacionados à qualidade de fabricação dos equipamentos durante as 250 primeiras horas de operação. Esses casos são identificados de acordo com o número do projeto e desenvolvidos/aprimorados com base na metodologia do Six Sigma, que define a oportunidade, mede as variáveis, implementa as melhorias e controla o desempenho do projeto”, diz Ivan Porto, gerente do Centro de Distribuição da Caterpillar em Piracicaba (SP).

Telemetria VolvoJá a Volvo Construction Equipment, de acordo com Alexandre Flatschart, diretor de customer solutions, prioriza os processos de inspeção e monitoramento dos equipamentos para mapear a operação e evitar a ocorrência de problemas durante a operação. Essas técnicas de manutenções preventivas e preditivas envolvem análise de óleo lubrificante e algumas tecnologias específicas, caso do CareTrack, que identifica proativamente causas potenciais de falhas. “Esse sistema estabelece ações preventivas para minimizar riscos de ocorrência de manutenção corretiva”, resume ele.

O histórico dessas ações, semelhantemente ao que fazem os demais fabricantes do setor, são computadas e permitem melhor planejamento tanto para a disponibilidade de peças no armazém central da Volvo, como também no inventário de peças da rede de distribuidores e da agenda dos técnicos de campo.