Rio de Janeiro se organiza para obter crédito de carbono até 2024

Além da Energia – 09.09.2021 – Com o PDS Rio (Plano de Desenvolvimento Sustentável e Ação Climática), a cidade busca reduzir emissões de gases de efeito estufa e manter o desenvolvimento econômico e social 

No início de junho, a prefeitura do Rio de Janeiro lançou um pacote climático, agregando dois grandes planos: Plano de Desenvolvimento Sustentável e Plano de Ação Climática (PDS), cujos direcionamentos abrangem várias diretrizes do planejamento estratégico da cidade e envolve todas as secretarias de governo, inclusive a de Meio Ambiente (SMAC). 

Nesta entrevista, feita ao site Além da Energia, Débora de Barros Augusto, subsecretária de Meio Ambiente da Secretaria Municipal de Meio Ambiente do Rio de Janeiro, explica o processo e mostra como a sua área está envolvida em alguns dos principais eixos temáticos do planejamento climático fluminense. Acompanhe. 

Quais são e como estão estabelecidas as metas climáticas da cidade do Rio de Janeiro? 

O último inventário de emissões de gases de efeito estufa foi realizado em 2017 e, com os dados coletados na ocasião, foi estabelecida neste ano a meta de reduzir as emissões em 20% até 2030 e nos tornar uma cidade zero carbono em 2050. É uma missão ousada, mas que está bem amparada nos Planos de Desenvolvimento Sustentável e Ação Climática. 

Como foi estabelecido o PDS? 

Ele está concentrado em cinco temas transversais: (1) Cooperação e Paz, (2) Igualdade e Equidade, (3) Longevidade e Bem-Estar, (4) Mudanças Climáticas e Resiliência e (5) Governança. No primeiro (Cooperação e Paz), estão estabelecidas ações inclusivas, de engajamento de redes comunitárias e participação popular nas decisões da cidade. Já no item de igualdade e equidade, além da inclusão social, são pensadas ações territoriais e econômicas, buscando ampliar conceitos de direitos e deveres e, assim, promover a cidadania, incluindo as questões de diversidade racial e de gênero. Isto foi desenvolvido com participação popular intensa, unindo contribuições de todas secretarias da esfera municipal e também de representantes da sociedade civil, como escolas, empresas e organizações não governamentais (ONGs). 

O processo foi feito remotamente, dada a pandemia? 

Começamos presencialmente, um pouco antes da pandemia, e depois o desafio foi justamente adaptar esse processo e transferi-lo para uma plataforma online, criada especificamente para o plano, a plataforma Participa.Rio. Essa plataforma, hoje, é um bem, um legado, para a administração municipal e está à disposição de todas as secretarias, que podem utilizá-la para realizar pesquisas e ações com a participação popular. A própria Secretaria Municipal do Meio Ambiente já utilizou esta plataforma, em consulta ao público para o desenvolvimento do site dedicado às ações de reflorestamento do órgão, o portal Refloresta Rio (https://refloresta-rio-pcrj.hub.arcgis.com/). Durante esse processo, estabelecemos um questionário com algumas perguntas e deixamos também um campo livre para contribuição da população com sugestões, críticas e questionamentos sobre o programa ou sobre o tema. 

E os outros três temas transversais do PDS? 

O próximo, Longevidade e Bem-Estar, envolve ações de habitação visando possibilitar acessos dignos como uma das formas de proporcionar qualidade de vida para vidas longas, ativas e saudáveis. Esse item abrange também algumas metas transversais com a pasta de meio ambiente, com ações que promovam o bem estar. 

O quarto item, Mudanças Climáticas e Resiliência, é o que está diretamente ligado à Smac e detém ações bem específicas, pelas quais a aspiração central é garantir que uma cidade com paisagem exuberante, como o Rio, seja resiliente e se torne neutra em emissões. Além disso, nosso objetivo é resgatar o protagonismo climático da cidade, o qual assumimos na ECO 92. Faremos uma agenda em março de 2022, com intuito de reunir prefeitos das grandes cidades mundiais para debater as ações programadas para o Rio no período 2020-30. 

O quinto e último aspecto, Governança, engloba ações já estabelecidas pela Prefeitura com foco em transparência, integridade e no cumprimento dos compromissos municipais assumidos na campanha do prefeito Eduardo Paes. Com esse objetivo, foi criada uma secretaria de governo e integridade (SEGOVI), para garantir a transparência integridade nas ações de toda administração municipal correlacionada com a secretaria de fazenda e planejamento. 

A participação de grandes cidades seria relativa ao Grupo C40 (de grandes cidades para liderança do clima)? 

Exatamente. O C40 foi fundamental para concretizar o Plano de Desenvolvimento Sustentável e Ação Climática. O grupo forneceu equipe técnica para consultoria, permitindo a organização de toda a metodologia do processo e também culminando em ações práticas, como por exemplo, o projeto Solário Carioca. Trata-se de uma fazenda solar, que será estabelecida como a primeira ação de geração autônoma de energia para abastecer as estruturas da administração municipal. Este projeto está pronto para receber financiamento e estamos empenhados para que haja a habilitação para uma parceria público-privada ainda neste ano. A implementação deste projeto visa atender prioritariamente o segmento escolar e hospitalar. 

Para a primeira fase do projeto da fazenda do Solar, já há área pré-definida. Trata-se de um aterro sanitário desativado em Santa Cruz, onde serão instalação painéis solares fotovoltaicos de até 5 MWp. Até 2050, contudo, a intenção é que o projeto seja ampliado a ponto de atender 100% da demanda de energia das edificações municipais. Ainda em 2030, a meta é que 25% dessas estruturas já estejam implementadas. 

As metas do Rio parecem bem alinhadas com o que lideranças mundiais ensejam apresentar na COP26… 

E estão mesmo. O Solário Carioca, por exemplo, será uma das ações que devemos mostrar na COP26. O PDS reúne projetos baseados em cenários de estudos e direcionados à transição para a economia de baixo carbono e soluções baseadas na natureza, mas sempre de forma viável para a cidade e os cidadãos. Não queríamos que este fosse apenas um “plano de papel” e, por isso, as metas foram estabelecidas com base em um estudo que computou e classificou dados de emissão de gás carbônico equivalente (CO2e) anualmente entre 2012 e 2017. Estes estudos nos permitiram projetar que a meta de emissões para 2030 seja um marco intermediário das aspirações e visões para 2050, o que configura mais uma demonstração clara de que estamos em linha com as principais lideranças mundiais e baliza a máxima de que atuamos localmente, mas pensamos de forma global. 

Como a eficiência energética está incluída no PDS? 

Quando se fala em mitigar a emissão de gases de efeito estufa, é imprescindível integrar as ações do setor de energia, onde as tecnologias emissivas estão migrando para tecnologias limpas. Além disso, temos de observar e acompanhar ações efetivas do setor privado, como a migração das empresas para o Mercado Livre de Energia, por exemplo. Ou seja, o setor privado é benchmarking para o setor público. 

Outra demonstração disso está no desenvolvimento energético, com uma migração cada vez mais intensa na área de transportes também, com o uso de biocombustíveis e experiências com transportes elétricos. Há também a gestão de resíduos, compondo os três macro temas das emissões (energia, transporte e resíduos). A administração municipal busca acompanhar a transição energética desses setores e para isso realiza ações coordenadas entre as secretárias de Transportes, Meio Ambiente, Limpeza Urbana e a da Fazenda e Planejamento, que tem a missão de acompanhar e monitorar as metas. 

Como é composto o Fórum de Governança Climática? 

Agimos em resposta a um pedido constante da sociedade e aproveitamos a publicação do decreto nº 48.491 de 04 de junho de 2021 que estabeleceu o Fórum de Governança Climática (FGC Rio), composto por:  

O FGC Rio será composto por 21 (vinte e um) membros da administração municipal e da sociedade civil. São eles: 

I – da Prefeitura do Rio de Janeiro:  

  1. a) o (a) Prefeito(a) da Cidade do Rio de Janeiro, Presidente do Fórum de Governança Climática;
  2. b) o (a) Secretário(a) Municipal de Meio Ambiente da Cidade, Secretário(a) Executivo do Fórum de Governança Climática;
  3. c) o (a) Secretário(a) Municipal de Fazenda e Planejamento;
  4. d) o (a) Secretário de Governo e Integridade Pública;
  5. e) um Representante da Coordenadoria de Relações Internacionais da Secretaria de Governo e Integridade Pública;
  6. f) o (a) Secretário Municipal de Planejamento Urbano;
  7. g) o (a) Secretário Municipal de Transportes;
  8. h) o (a) Secretário Municipal de Desenvolvimento Econômico, Inovação e Simplificação;
  9. i) o (a) Secretário Municipal de Infraestrutura;
  10. j) o (a) Presidente da Fundação Rio Águas.

II – dez (10) representantes da Sociedade Civil;  

III – o (a) Secretário(a) Geral do Fórum de Governança Climática. 

Atualmente estamos recebendo as contribuições e manifestações de interesse em participar do FGC Rio e, a além disso, recebemos solicitações para criar câmaras técnicas para subsidiar as ações do PDS e do PAC. Essa estrutura é importante pra discutir, soluções técnicas para mitigar as emissões de gases de estufa, por exemplo. 

Como estão estabelecidas as ações diretas da Secretária de Meio Ambiente no PDS? 

Como citado anteriormente, o quarto eixo (Mudanças Climáticas e Resiliência), é coordenado pela Smac. Além disso, temos outras ações distribuídas pelos demais temas transversais. Uma delas é a gestão de resíduos, que é um grande problema nas metrópoles brasileiras. Nesse aspecto, desenvolvemos recentemente um planejamento diferente, voltado à conscientização para descarte de lixo, que envolve campanhas de coleta seletiva correlacionado a um trabalho de educação ambiental focado também na prevenção de enchentes. Também há link com os demais programas de educação ambiental, como os voltados aos cuidados com rios, ao reflorestamento e o de segurança alimentar da população, por meio das Hortas Cariocas (programa de hortas do município). 

Voltando à questão dos resíduos, temos como meta mostrar para a população que não adianta apenas a ação do governo municipal na retirada de resíduos em rios, lagoas e áreas terrestres. É preciso, e muito importante, ações de conscientização e sensibilização de educação ambiental focado na redução do descarte incorreto. Defendemos que o sucesso disso é que permitirá, inclusive, que a administração municipal concentre esforços em outras atividades evolutivas. 

Outro programa amplo no qual a Smac está envolvida junto com Companhia de Limpeza Urbana é o incentivo a veículos pouco ou nada emissores. Neste caso, está em andamento a troca dos caminhões de coleta de lixo domiciliar por modelos de propulsão elétrica. A ação já está iniciada, com algumas unidades de caminhões elétricos em circulação desde 2019, mas ainda em fase inicial quando considerado o volume de veículos que circulam com essa finalidade na cidade. 

A Smac também coordena ações de preservação ambiental? 

Sim e estamos trabalhando para ampliar as áreas protegidas da cidade, com a criação de novas unidades de preservação. A Smac já tem estudo, publicado em 2018, que identifica a fragilidade ambiental da região do Recreio, Vargem Grande e Vargem Pequena, inclusive com registro de espécies endêmicas desse habitat e recentemente foi publicado o Decreto n. 48990 DE 17 DE JUNHO DE 2021 que cria a área de especial interesse ambiental dos bairros de Vargem Grande, Vargem Pequena, e parte dos bairros do Recreio dos Bandeirantes e Camorim na XXIV Região Administrativa, que faz parte do processo de criação da nova unidade de conservação. 

O processo impede novas construções na região de Vargens? 

Não, e essa foi uma preocupação constante. Sempre atuamos pensando em não inviabilizar as construções, mas sim em delimitá-las para que possibilitem, na medida do possível, a coexistência com a natureza. De modo prático, estamos avaliando algumas possibilidades de atividades de lazer como: ecoresorts, torres de observação de avi-fauna e outras que possam coexistir sem degradar o meio ambiente na região. 

No total, trabalhamos em cinco áreas de planejamento da cidade. 

Há outros direcionamentos da Smac, principalmente dentro do tema transversal que ela lidera no PDS? 

Há sim e um deles é pensado em conjunto com a Secretaria de Planejamento Urbano que visa estabelecer incentivos para o desenvolvimento de áreas com potencial agrícola. Em resumo, portanto, a Smac tem atuações diretas para a melhor gestão nos segmentos: resíduos sólidos, resiliência cidadã (protegendo e ao mesmo tempo permitindo a utilização consciente de áreas preservadas), neutralização do carbono e gestão de ativos ambientais. Isso tudo está em linha com o que o setor privado e grandes cidades estão em desenvolvendo mundialmente. Inclusive, publicamos recentemente o Decreto nº 48995 DE 22 DE JUNHO DE 2021 que dispõe sobre a criação de Grupo de Trabalho destinado a empreender estudos, realizar análises e propor ações e projetos relacionados ao desenvolvimento de um mercado de créditos de carbono na cidade do Rio de Janeiro o que demonstra que a eficiência das ações ambientais nos trará retorno sobre os investimentos (ROI).