Por Nelson Valêncio – 31.10.2016 –
Dados iniciais indicam que veículo consumiria 65% a menos de combustível do que o convencional a diesel. Adoção da tecnologia, no entanto, vai depender de vários fatores. Segunda geração se diferencia da primeira pela recarga externa da bateria.
Apesar da não renovação da frota com mais de dez anos – segundo o portal G1, em reportagem do ano passado, seriam 183 ônibus de um total de 1,4 mil veículos – a capital paranaense ainda continua inovando em transporte público. Do total de 1.320 ônibus listados no site da Urbanização de Curitiba (URBS), empresa municipal responsável pelo setor, 30 são híbridos elétrico-diesel. Agora, a cidade testa uma nova geração desse tipo de veículo, onde a principal diferença é a recarga externa da bateria de íons de lítio no ponto de ônibus.
O teste começou na segunda quinzena de agosto último e poderá acontecer até o fim de janeiro de 2016, num trajeto específico de 22 km (circuito total). Para comparar o desempenho dessa segunda geração, como está sendo chamado o novo ônibus híbrido, o teste envolve outros dois veículos – um híbrido da primeira geração, ou seja, sem recarga externa no ponto, e um convencional movido a diesel. Os dados preliminares da Volvo, divulgados na semana passada, indicam que o ônibus em teste opera 55% do tempo no modo elétrico, roda cerca de 1,3 mil km por semana e apresenta uma economia de combustível de 65% em relação ao convencional a diesel e de 30% em relação aos veículos de primeira geração.
Os números são interessantes, mas é bom lembrar que percentualmente os híbridos elétrico-diesel de primeira geração representam pouco mais de 2% da frota atual de Curitiba. O mercado potencial é maior, considerando que a capital paranaense teria uma meta de adotar pelo menos 10% de ônibus urbanos com energia com baixa emissão de poluentes até 2020, ou seja algo entre 160 e 170 ônibus, segundo os especialistas que participaram o lançamento oficial do projeto na semana passada.
Para disputar esse universo, os ônibus elétrico-diesel da Volvo ou de outro fabricante – vão ter enfrentar o fator financiamento. Esse ponto foi destacado por Roberto Gregório, presidente da URBS. Os incentivos podem vir da renúncia do ICMS sobre a energia elétrica, iniciativa que reduziria a recarga em pelo menos um terço, entre outros movimentos. Para alguns técnicos, os incentivos aos operadores de frotas urbanas deveriam ser uma política de estado, como acontece em Londres, onde há o pagamento da diferença do investimento em híbridos em até um mês após a compra. Com isso, o problema de investimento em capital (Capex) passa a ser uma preocupação de custo de operação (Opex), gerenciável no tempo de vida dos veículos (em Curitiba, os híbridos podem rodar por 12 anos, doia a mais do que os convenvionais a diesel).
O relatório Real World Performance of Hybrid and Eletric Buses, produzido pela Grutter Consulting sob encomenda de entidades suíças em fevereiro de 2015, comprova isso. O documento analisa o cenário em três cidades onde os híbridos estão presentes há um longo tempo e podem ser comparados aos ônibus convencionais: Zhengzhou e Shenzhen, na China, e Bogotá, na Colômbia. Segundo a pesquisa, no prazo normal de operação, os híbridos, independente do tipo de combustível ou tamanho (12 ou 18 metros, os mais padronizados) economizam em média entre 25% e 35%. No caso dos veículos com recarga externa, os índices podem ser maiores – entre 40% e 50%.
Em termos de disponibilidade, os veículos também não perdem para os convencionais a diesel, mas os custos de manutenção precisam ser analisados com mais calma. No caso de Bogotá, que adota os híbridos elétrico-diesel de primeira geração da Volvo, o valor do kit da bateria corresponde a US$ 50 mil do total de US$ 290 mil do investimento em cada veículo. A mágica, nesse caso, é transformar o Opex em Capex, com o leasing da bateria, um valor de US$ 0,15 por km, de acordo com o relatório da Grutter Consulting.
Segundo Fabiano Todeschini, recém-empossado presidente da Volvo Bus Latin America, o modelo de leasing também acontece no Brasil, mas os dados da fabricante – que monitora via telemática o desempenho das baterias em toda a frota mundial da marca – mostram que a vida útil ultrapassa a estimativa de quatro anos no caso da primeira geração de híbridos. Ele acredita que a performance pode ainda ser melhor nos híbridos de segunda geração, como o ônibus testado atualmente no país.
“República de Curitiba” busca vanguarda, e não é na Lava Jato
Vamos aos números: rodando em média 1,3 mil km por semana e operando 55% do tempo no modo elétrico, o ônibus em teste economizaria 15 mil litros de diesel por ano, ou seja R$ 45 mil se mantido o preço médio de R$ 3/litro. As condições ideais seriam da recarga a cada 10 km, mas a avaliação atual envolve apenas uma estação de recarregamento ao longo dos 22 km, em razão de limitações técnicas e de tempo.
A Volvo já fez um mapeamento dos fatores que podem influir no processo, condensados num documento chamado de PMI, sigla pra procedimento de manifestação de interesse, que é uma espécie de anteprojeto para a definição da licitação para uma parceria público-privada (PPP). Explicando: a prefeitura de Curitiba pode usar as informações para estruturar uma ação que contemple a combinação de terminais de ônibus com locais onde a recarga seja mais atrativa, tanto para a cidade como para um operador privado.
Enquanto a segunda geração de híbrido diesel-elétrico amadurece em Curitiba, a Volvo mira no mercado da América Latina (exceto México, onde a divisão Latin America não atua). Estamos falando, é claro, da primeira geração e Todeschini adianta o caso do Chile, que deverá ter uma grande licitação de renovação de frota em 2018. A negociação atual no país vizinho envolve 20 veículos. No Peru, onde a energia renovável predominante na frota urbana é o gás natural, há o interesse na realização de teste e o mesmo acontece com a Argentina.
A iniciativa da Volvo faz sentido, uma vez que os dados da consultoria Frost & Sullivan, citados no relatório da Grutter Consulting, indicam que 21% dos 300 mil ônibus urbanos e para interligação metropolitana a serem comercializados em 2020 deverão ser absorvidos pela América do Sul. A China sozinha responderá por um quarto do total, mas os chineses, como é sabido, compram de players locais.
Nelson Valêncio, editor executivo do Infraroi, foi a Curitiba a convite da Volvo.