Da Redação – 11.10.2017 –
Nessa entrevista, Tomas Alvim, fundador do Arq.Futuro, uma plataforma apartidária que vem discutindo o futuro das cidades, fala dos desafios que envolvem as grandes capitais do mundo – e que tendem, infelizmente a se repetir para as médias e pequenas localidades. Junto com entidades como a Fundação Getúlio Vargas (FGV) e o Instituto Moreira Salles, o Arq.Futuro tem mostrado experiências bem sucedidas em infraestrutura urbana ao redor do mundo.
Infraroi – Como nasceu o Arq.Futuro?
Tomas Alvim (TA): Nasceu dentro da editora BEI (do qual ele é editor) há sete anos, com a iminência da Copa do Mundo e com a visão de que a infraestrutura urbana e qualidade arquitetônica não estavam sendo discutidas adequadamente. As decisões equivocadas mostraram o resultado, com apenas 25% obras urbanas sendo implantadas. Houve uma transformação urbana importante em mobilidade no Rio de Janeiro, mas com problemas na instalação dos alojamentos – muito distantes – enquanto o Porto Maravilha está ocioso. O Arq.Futuro quer apresentar novas ideias, sendo uma iniciativa apartidária, que envolve sociedade civil, governo e iniciativa privada. A proposta é termos um acordo mais amplo e não ficar reféns de mandatos, pensar um planejamento urbano de longo prazo. Somos uma plataforma de conteúdo para apresentar novas ideias de Brasil e do mundo.
InfraROI – E o que fazer com a infraestrutura que foi construída?
TA: Como se remedia? É uma decisão amarga, precisa de decisões radicais. Veja o caso do estádio de Brasília, que jamais terá viabilidade porque não tem público que o sustente. As decisões precisam ser tomadas friamente, analisando-se caso a caso. Em São Paulo tínhamos pelo menos três estádios e fomos fazer um quarto. Quem está pagando essa conta somos nós. É necessária uma revisão dos equipamentos que podem ter viabilidade econômica e derrubar os que não têm. É preciso resgatar o que estava pensado e as melhores intervenções para as cidades.
InfraROI – No caso de mobilidade, vocês tem discutido muito a relação entre moradia e trabalho nas cidades…
TA: É uma decisão urgente, pois continuamos a produzir subúrbios, com raras exceções, em função do espraiamento das cidades. E isso as torna inviáveis administrativamente, com moradias de baixa renda longe do trabalho das pessoas. Outra questão é o saneamento urbano, onde lidamos com índices medievais e indicadores completamente desatualizados. Há iniciativas que repensam isso, caso da Casa Paulista, na capital, com moradias em centros urbanos, numa região que vai do Brás à Barra Funda. É um projeto integrado, que produz uma cidade mais diversificada. Outro exemplo envolve as moradias acessíveis em Brasília. São contrapontos a projetos como o Minha Casa Minha Vida, os quais têm aparentemente custam menos, mas agregam custos adicionais. Há informações de duplicação dos custos de transporte de alunos em locais de ativação do Minha Casa Minha Vida.
InfraROI – O espraiamento das cidades é um problema brasileiro ou se repete em outros locais?
TA: É universal. Embora as soluções e propostas sejam diversas, não há equação que feche de maneira universal. Há modelos de políticas públicas direcionadas, mas estamos falando de projetos de estado e não de governo, com participação da prefeitura e investimento do governo federal e estadual. O aluguel social é outra novidade adotada por muitas cidades e o modelo é de o morador tenha o usufruto, mas não a posse do imóvel. As cidades têm espaços urbanos e é preciso estimular o seu uso, incluindo a adoção de IPTU progressivo e outros mecanismos inteligentes que viabilizem o uso desses locais. É o caso da regulamentação de áreas contaminadas, anteriormente de uso industrial, e que estão localizadas em regiões centrais. Desde que devidamente avaliadas, elas podem permitir o adensamento urbano racional.
InfraROI – Curitiba já foi apontada como exemplo de planejamento urbano. Ainda o é?
TA: A cidade teve uma produção imobiliária estimulada pelo plano diretor. Foi muito eficaz, mas produziu um adensamento urbano para a classe média. O perfil dos empreendimentos mostra que o planejamento sozinho não funciona e que é preciso ter mecanismos de indução para o estabelecimento de valor de moradia para baixa renda. A regulação propicia essa indução. Mas, lembrando: todas as grandes cidades do mundo enfrentam o mesmo problema.
InfraROI – E parece que há uma repetição em relação ao saneamento?
TA: Sim e o problema passa pela falta de governança e de consciência. O consumo per capita de água no Brasil está muito acima do que a ONU estabelece como viável. No caso de São Paulo temos uma cidade cercada por vários rios e represas, mas todos poluídos. Se não fosse o despejo de esgotos, o Rio Pinheiros, por exemplo, teria 20% do seu volume. E mais: 40% do lixo descartado no rio é carga difusa, ou seja, lixo de pessoa física. Quase metade. Há bairros de alta renda que não tem instalações de conexão para esgoto, então não é um problema de assentamentos provisórios. As iniciativas devem envolver a recuperação do rio e de seu entorno. Madri tem iniciativas destacadas, como a ativação de parques lineares ao longo do rio Manzanares. A limpeza dos rios não acontece em curto prazo, precisa ter envolvimento do cidadão, assim como em outras áreas. O resultado é uma cidade mais inclusiva, mais sustentável e mais prazerosa.