Extensão da tragédia de Mariana segue desconhecida

Da DW Brasil – 07.11.2017 –  Dois anos depois, diagnóstico dos danos causados no maior desastre ambiental do Brasil ainda não foi concluído. Previsão é que remoção de resíduos acabe em 2020, e estima-se que R$ 2 bilhões sejam pagos em indenizações. Nos últimos dois anos, os sonhos e pesadelos de José do Nascimento de […]

Por Redação

em 7 de Novembro de 2017

Da DW Brasil – 07.11.2017 – 

Dois anos depois, diagnóstico dos danos causados no maior desastre ambiental do Brasil ainda não foi concluído. Previsão é que remoção de resíduos acabe em 2020, e estima-se que R$ 2 bilhões sejam pagos em indenizações.

Nos últimos dois anos, os sonhos e pesadelos de José do Nascimento de Jesus, 71 anos, não mudaram. Seu Zezinho, como o líder comunitário de Bento Rodrigues é conhecido, aguarda o dia em que se mudará definitivamente, com outras 250 famílias, para o novo vilarejo que será reconstruído em Mariana, Minas Gerais.

As imagens sombrias de destruição do subdistrito Bento Rodrigues original ainda o assombram. Era 5 de novembro de 2015 quando uma enxurrada de lama levou construções, móveis e recordações de uma vida inteira.

“A gente continua esperando, acha que teve um prolongamento da indefinição”, critica Zezinho o ritmo de reparação de danos sofridos após o rompimento da barragem de rejeitos da mineradora Samarco, controlada pela Vale e pela BHP. O episódio deixou 19 mortos, desabrigados, rastro de contaminação na bacia do rio Doce e causou o maior desastre ambiental do Brasil.

O vilarejo Bento Rodrigues, o mais arrasado pela onda de lama, deve ser reconstruído em novo local até março de 2019. Mas esse é apenas um ponto no mapa de recuperação dos estragos causados pelo rompimento da barragem de Fundão. Dois anos depois, a dimensão dos impactos do desastre ainda está sendo calculada, segundo o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG).

“A consultoria Institutos Lactec está elaborando o diagnóstico de todo o dano ambiental ao longo da bacia do rio Doce. A partir desse diagnóstico será possível apontar as medidas necessárias para a recuperação e os danos não mitigáveis, ou seja, aqueles que necessitarão ser compensados, pois será impossível retornar ao status quo ante”, afirma Andressa Lanchotti, coordenadora da força-tarefa do MPMG que atua no caso.

A empresa foi contratada pelo MPMG para munir os promotores de informações técnicas. Segundo o acordo assinado em janeiro último, a Samarco assume os custos. “O resultado do trabalho é independente”, pontua Lanchotti.

Dois anos de rejeitos no ambiente

Para a Fundação Renova, o diagnóstico está completo e foi apresentado há poucos meses no Plano de Manejo de Rejeitos. A entidade foi criada para cuidar de todo o processo de reparação e restauração ambiental, segundo o Termo de Transação de Ajustamento de Conduta (TTAC) fechado entre as acionistas Vale e BHP e autoridades brasileiras.

O plano detalha como será feita a remoção dos resíduos espalhados por toda a bacia do rio Doce. “A região foi dividida em 17 frentes, cada uma com uma forma específica de atuação do ponto de vista técnico”, comenta Roberto Waack, presidente da Renova. “Em alguns lugares, o rejeito vai ficar onde está pois já se estabilizou e não causa danos. Em outras, será removido.”

Estima-se que 39,2 milhões de metros cúbicos de resíduos de mineração tenham descido pelo córrego Santarém e seguido os rios Gualaxo do Norte, Carmo e Doce até chegarem ao mar. Um volume que corresponde a cerca de 120 navios petroleiros de grande porte.

O plano de manejo começa a ser executado até o fim de 2017, dois anos depois do rompimento de Fundão. “A previsão é que, ao final de três anos, seja equacionada a presença de rejeito nessas regiões”, afirma Waack. A hidrelétrica Risoleta Neves, que acumulou volume considerável dos resíduos e ficou inoperante desde então, deve voltar a funcionar em junho de 2018.

BHP e um passado de degradação

Na Oceania, a australiana BHP foi protagonista de uma das maiores batalhas judiciais devido aos impactos da mineração que provocou em Papua Nova Guiné – que só conseguiu independência da Austrália em 1975. Os processos foram movidos na Justiça australiana a partir de 1994 por pequenos produtores rurais de Papua Nova Guiné, que alegavam que as atividades da BHP arruinaram o modo vida e o meio ambiente locais.

Em 1984, a BHP passou a extrair ouro e cobre da mina Ok Tedi, nas montanhas da parte ocidental. No mesmo ano, um deslizamento destruiu a barragem que armazenava os resíduos, mas a BHP conseguiu autorização para não interromper as atividades – sem a barragem, os rejeitos iam diretamente para o rio Fly.

Todos os dias, 80 mil toneladas de lixo da mineração eram despejados no rio, com efeitos dramáticos na vida de 30 mil moradores e 2 mil quilômetros quadrados de floresta tropical, segundo um relatório das Nações Unidas que avaliou o desenvolvimento humano de Papua Nova Guiné.

“O impacto ambiental massivo da mina tem sido o aspecto mais marcante da operação da Ok Tedi”, comenta o documento, publicado em 2014. “A mineradora demonstrou claramente que pode haver um enorme custo econômico causado pela instabilidade social e ambiental.”

Em 2002, BHP deixou Papua Nova Guiné e a Ok Tedi passou a ser administrada pelo Estado. Naquele ano, a empresa assinou um acordo com os moradores locais que livrava a companhia de futuras cobranças na Justiça. Em 2013, o parlamento australiano acabou com a imunidade da BHP e, em 2014, uma decisão judicial ordenou que Ok Tedi parasse de jogar os rejeitos diretamente no rio.