Sem informação, reciclagem não funciona

Clarissa Neher – DW – 17.07.2019 (*) Para quem vem de fora, todos os alemães parecem ser craques na separação de lixo. Mas a introdução de contêineres para resíduos orgânicos em Berlim mostrou a importância de campanhas educativas. Lembro-me muito bem de quando Curitiba deu início ao programa de separação e coleta seletiva de lixo. […]

Por Redação

em 17 de Julho de 2019

Clarissa Neher – DW – 17.07.2019 (*)

Para quem vem de fora, todos os alemães parecem ser craques na separação de lixo. Mas a introdução de contêineres para resíduos orgânicos em Berlim mostrou a importância de campanhas educativas.

Lembro-me muito bem de quando Curitiba deu início ao programa de separação e coleta seletiva de lixo. Era o final da década de 1980 e início dos anos 1990, e uma grande campanha educacional e informativa foi lançada na cidade. Na minha escola, assistimos a palestras com a Família Folha, que explicou como separar “o lixo que não é lixo” e a importância disso.

Deveríamos repassar aos nossos pais o que aprendemos. Houve também propagandas na televisão e distribuição de folhetos explicativos. Tudo para que a população se conscientizasse do novo sistema que estava sendo implantado na cidade. A campanha educativa parece ter surtido efeito. Hoje, a separação do lixo é algo que faz parte do cotidiano de grande parte dos moradores de Curitiba.

Na Alemanha, a separação do lixo começou em 1991. Basicamente, há quatro tipos de lixo aqui: residual (comum), papel, embalagens e vidro. O país também tem um sistema de garrafas de plástico e vidro retornáveis. Um valor adicional que varia entre 0,08 e 0,25 centavos de euro é cobrado quando se compram bebidas. Ao devolver as garrafas em supermercados, o consumidor recebe esse valor de volta.

À primeira visita, o sistema de separação de lixo parece funcionar muito bem. No entanto, quando um novo contêiner de lixo surge repentinamente no prédio, os limites desse conhecimento parecem vir à tona. Desde 1º de abril deste ano, a separação do lixo orgânico é obrigatória em Berlim. A cidade espera recolher cerca de 100 mil toneladas desse resíduo por ano.

A mudança foi amplamente anunciada nos meios de comunicação, porém, no meu prédio, por exemplo, os moradores não receberam materiais informativos sobre o que é lixo orgânico e o que pode ou não ir para o contêiner. Não havia o contêiner de lixo orgânico antes de ser obrigatório. Ele apareceu no prédio do dia para a noite.

Como acompanho o noticiário, eu sabia da mudança e fui buscar informações sobre o que pode ser jogado no contêiner (basicamente restos de qualquer comida, filtros de café e chá, papel toalha, flores, mas tudo sem embalagens plásticas). Meus vizinhos, porém, aparentemente não se informaram sobre a mudança, e o contêiner de lixo orgânico acabou virando mais um de lixo comum.

Enquanto não houver a iniciativa do dono do prédio ou de algum morador de buscar folhetos informativos sobre a separação do lixo, provavelmente a situação continuará assim. Ou até o lixo parar de ser recolhido, como acontece quando a separação não está sendo feita corretamente – e nesses casos é cobrada uma multa.

Acredito que a situação não seja exclusiva ao meu prédio. Cerca de 50 mil novos contêineres de lixo orgânico foram distribuídos na cidade somente nos três meses que antecederam a data da obrigatoriedade entrar em vigor. Eu mesma, se não tivesse acompanhado o noticiário, não saberia o que jogar no contêiner novo.

Essa situação revela a importância de conscientizar a população da importância da separação do lixo, mesmo quando isso parece já estar enraizado no cotidiano. Não adianta ampliar a possibilidade de reciclagem sem uma campanha educativa, até mesmo entre alemães e aqueles que já moram há anos na Alemanha.

Sei de amigos estrangeiros que vêm de cidades onde não há coleta seletiva e tiveram dificuldades de se adaptar à separação do lixo na Alemanha. Seria tudo mais fácil se, junto com o contrato de aluguel de um imóvel, viesse um folheto informativo sobre como funciona a reciclagem no país.

(*) Clarissa Neher é jornalista da DW Brasil e mora desde 2008 na capital alemã. Na coluna Checkpoint Berlim, escreve sobre a cidade que já não é mais tão pobre, mas continua sexy. Publicado originalmente na DW Brasil.