Isabela Morbach* – 27.07.2023 –
Os projetos de Captura e Armazenamento de Carbono (CCS) têm suscitado debate e interesse entre diversos setores econômicos produtivos, entidades governamentais e a sociedade de modo geral, como um modo de ampliar as estratégias de descarbonização e de redução dos gases do efeito estufa. Afinal, o potencial de captura de CO2 brasileiro pela via tecnológica é de 200 milhões de toneladas ao ano, quase cinco vezes a capacidade em operação no mundo. O que impede então a transformação deste debate em investimentos em projetos efetivos? Ausência de legislação e regulação nacional sobre o tema.
A Captura e o Armazenamento de Carbono (CCS) envolve uma série de soluções tecnológicas cuja aplicação com objetivo de armazenar permanentemente o CO2 e reduzir emissões não é abrangida pela legislação vigente. Além disso, são projetos de infraestrutura que demandam investimentos iniciais de grande porte. Para que esses projetos de fato recebam investimentos é preciso ter segurança jurídica, uma vez que o investidor quer entender quais são suas obrigações, pontos de riscos nas atividades envolvidas e quais regras precisam ser seguidas. Tais definições são essenciais para a elaboração de planos de negócios para financiamentos na área.
No caso do CCS, há ainda outras particularidades que merecem atenção. Uma delas diz respeito ao armazenamento geológico de CO2, que envolve a exploração e injeção do CO2 em reservatórios geológicos. Esses reservatórios são bens da União, ou seja, pertencem ao poder público e, portanto, não podem ser explorados sem que o instrumento jurídico que permite sua exploração esteja expressamente descrito na legislação. Com o regramento atual, hoje não é possível injetar CO2 em reservatórios. Até mesmo a definição jurídica de termos como “CCS” e “fonte estacionária” não são abarcados pela legislação, assim como uma série de condições necessárias para essa operação.
Para os potenciais operadores de CCS é preciso ter claro qual será a autoridade outorgante e reguladora, quais as condições necessárias para a outorga e por quanto tempo ela será permitida a injeção. A experiência internacional, a partir de legislações já criadas sobre o assunto nos Estados Unidos, Canadá, Austrália, Noruega, Reino Unido e na União Europeia de modo geral, demonstra que esse é o caminho a ser seguido. Em todas elas essas definições estão muito claras.
Outro ponto muito importante é a delimitação da responsabilidade de longo prazo pelo CO2 armazenado e a obrigação de monitoramento, também presentes nos regramentos de diversos países. É preciso deixar claro qual a definição de transferência de responsabilidade, ou seja, por quanto tempo o operador vai precisar monitorar e comprovar a estabilização do CO2 no reservatório e quanto tempo ele levará para devolver a área para a União após o encerramento das operações na área. O limite desta responsabilização é ponto essencial a ser precificado no plano de negócios.
Hoje, indústrias dos mais diversos segmentos como siderurgia, cimento, papel e celulose, fertilizantes, óleo e gás, energia e produtoras de combustíveis já sabem o que é o CCS e já estão avaliando oportunidades nesse segmento. Mas sem segurança jurídica os projetos não saem do papel e os recursos seguem travados.
É importante deixar claro que os projetos de CCS levam tempo para serem desenvolvidos e, portanto, existe um período considerável entre a decisão de investir e o desenvolvimento das ações na prática. A partir do momento em que o marco regulatório for aprovado e destravar de vez os investimentos, se tudo der certo, serão pelo menos três anos até que os primeiros projetos saiam do papel. O Brasil já está atrás de países que aprovaram suas regulamentações há quase uma década e hoje desenvolvem seus primeiros projetos. Por isso, é preciso correr para trazer a segurança jurídica. Assim como as mudanças climáticas causam impactos cada vez maiores, também não há mais tempo a perder em relação aos estímulos para uma solução importante no processo de descarbonização da economia brasileira.
*Isabela Morbach é advogada e cofundadora da CCS Brasil.