Por Enrico Mangoni*
As mudanças climáticas são uma realidade que afetam o mundo inteiro. A alteração do clima é bastante debatida, mas existem claras indicações de sua ligação com a atividade humana dos últimos 150 anos. Um exemplo: a curva dos incrementos da temperatura média no globo terrestre neste período replica a curva dos incrementos das emissões globais de CO2.
A construção civil convencional é com certeza uma atividade fundamental para a vida de cada um de nós, mas é muito poluidora. E a construção realizada nos dias de hoje é ainda pior que a do passado. Antigamente, pelo menos eram empregados materiais naturais que duravam e conservavam as construções por muito tempo, o que não acontece atualmente. Hoje sabemos que, em média, a construção civil é responsável para cerca de 40% das emissões globais, somando a contribuição das novas construções às já existentes.
A relação entre construções e emissões é bem clara: as emissões provocam mudanças climáticas com eventos extremos. Estes, por sua vez, impactam principalmente as regiões mais pobres, onde estão as construções mais precárias, determinando, assim, a migração de pessoas para os grandes centros urbanos. E estas aglomerações urbanas são, notoriamente, as mais responsáveis pelas emissões de CO2 da construção civil.
Para minimizar tal cenário, a construção civil precisa ser a mais sustentável possível. Sustentabilidade não é perfeição: cada atividade humana é poluidora e consome energia. O foco deve ser construir de forma menos impactante possível ao ambiente.
A atuação deve ser feita em diversos níveis: primeiro, produzindo materiais menos poluentes (fala-se em “descarbonização”), mas também projetando construções otimizadas, com o menor desperdício possível de materiais, considerando o impacto ambiental não de forma voluntária, mas como um requisito essencial das construções, olhando para todo o processo construtivo e não somente na escolha dos materiais.
Em tal visão, todas as soluções que empregam logísticas e montagens mais rápidas e com recuperação de boa parte dos materiais empregados são preferíveis. As construções em aço dominam este cenário, ajudando muito na atuação da economia circular na construção civil.
Sabendo que a vida útil de uma estrutura não deveria ser inferior a 50, 100 anos, é extremamente importante realizar construções “flexíveis e adaptáveis”, seja para acolher diferentes usos, seja para enfrentar com resiliência os eventos climáticos extremos. As estruturas de aço têm naturalmente esta potencialidade, por isso são empregadas também para adaptar as estruturas existentes de concreto.
Um bom exemplo é o empreendimento Triton Square, em Londres. O prédio foi remodelado para novo uso e teve sua área total expandida em 70%, com a adição de três novos pisos. Optou-se por reutilizar o máximo possível da estrutura já existente. No total, a reforma economizou 40 mil toneladas de carbono. O edifício é considerado hoje uma das sedes com menor emissão de carbono do Reino Unido.
Neste sentido, o futuro das construções vai muito além da imagem do passado da construção – cujo esqueleto deveria ser o mais rígido e sólido possível – indo para soluções rígidas e sólidas, mas que sejam facilmente desmontáveis e adaptáveis.
Pensar em construção sustentável é pensar a longo prazo. É planejar um empreendimento sem se preocupar somente com os custos diretos e imediatos da obra, mas nos custos ao longo da vida daquela construção, entendendo assim que construir de forma sustentável não é somente custo, mas investimento econômico e ambiental.
O conceito é facilmente replicável a construções já existentes, evidenciando a importância econômica e ambiental da atividade do retrofit como sistema para minimizar as emissões.
A visão da construção sustentável e menos poluidora também abrange favoravelmente à necessidade da industrialização da construção, invocada por muitos especialistas do setor como a salvação para o futuro próximo da construção brasileira, que passa por um momento crítico. Está faltando mão de obra para trabalhar na construção convencional, principalmente mão de obra qualificada.
Tal carência gera ineficiência e maiores custos na construção convencional, além do impacto ambiental negativo já amplamente reconhecido que a construção em canteiro costuma gerar. Soma-se a isso o fato de serem construções com baixa vida útil e necessidade de serem reparadas/reforçadas várias vezes ao longo do tempo, com consequentes emissões não devidas e impacto econômico/financeiro na sociedade.
A industrialização da construção certamente ajudará muito a torná-la mais sustentável e a minimizar as mudanças climáticas. Importante, porém, ter especial atenção na proposição de soluções já testadas e com ótima vida útil.
Para dar essa guinada e diminuir o impacto ambiental, a construção civil precisará não só de uma mudança cultural como do apoio de toda a cadeia do setor: dos fornecedores dos materiais, dos projetistas, da logística e da organização dos canteiros.
Acredito muito em um futuro em que a maioria das construções utilizará sistemas industrializados híbridos, feitos com diferentes materiais, a fim de ter eficiência e menor impacto ambiental no produto final, perseguindo um dos conceitos fundamentais da sustentabilidade: “fazer o máximo com o mínimo”.
*Enrico Mangoni é empresário e engenheiro civil formado pela Faculdade de Engenharia Civil da Universidade de Florença. É proprietário da empresa Studio Mangoni, com sede na Itália e filial no Brasil.