Mineração e o problema que todos gostaríamos de ter

Nelson Valêncio – 12.04.2022 – A consultoria McKinsey destacou o atual ciclo virtuoso da mineração mundial, com a alta nos preços de commodities e a consequente geração positiva de fluxo de caixa. O “problema” é como usar os excessos, principalmente se os valores de comercialização continuarem na mesma tendência. “Os líderes podem considerar diferentes táticas para abordar o crescimento, gerenciar dívidas e dividendos e repensar as práticas organizacionais existentes. Eles também devem desenvolver uma visão de longo prazo sobre os preços que ajudará a informar as decisões financeiras no futuro”, resume o artigo escrito por quatro especialistas – Himangi Gupta, Siddharth Periwal, Oliver Ramsbottom e James Whitecross – e publicado no final de fevereiro desse ano.

Intitulado How to navigate mining’s cash-flow conundrum (Como navegar no enigma do fluxo de caixa da mineração, em tradução livre), o material chama a atenção para o que aconteceu no superciclo de aumento de preços anteriores – e suas consequências negativas. Entre 2009 e 2011, os preços elevados das commodities permaneceram sucederam uma crise financeira global. Com a geração positiva de fluxo de caixa, o setor viveu “uma enxurrada subsequente de atividades de fusões e aquisições e investimentos em projetos resultou em estouros de gastos de capital, estruturas de custos inchadas e baixas contábeis de ativos. O restante da década foi amplamente gasto na reconstrução de balanços”, explicam os autores, detalhando a grande lição que o segmento pode tirar do momento atual.

E os ensinamentos são claros: os ensinamentos indicam que seria importante adotar uma estratégia de expansão atualizada, que incluiria o crescimento orgânico, ao mesmo tempo em que as mineradoras poderiam repensar as decisões de alocação para enfatizar mais investimentos novos (greenfield) e processos sustentáveis, que são mais adequados ao cenário regulatório em evolução de hoje. “Uma estratégia de fusões e aquisições construída em torno de uma série de negócios menores poderia melhorar as perspectivas de crescimento e evitar algumas das armadilhas de grandes aquisições anteriores feitas com prêmios elevados”, dizem os analistas da McKinsey.

Outras duas orientações indicam a adoção de processos mais flexíveis para gerenciar a alavancagem de projetos de investimento e a criação de perspectivas de preços de commodities, uma vez que ambas podem equilibrar algumas incertezas no próximo ciclo de negócios. Os dados recentes mostram que o uso atual do fluxo de caixa positivo tem sido mais conservador do que no passado. “Um ligeiro aumento nas despesas de capital e M&A sugere uma abordagem cautelosa por parte da liderança”, dizem os especialistas.

Na prática isso se reflete em relação aos fluxos de caixa das operações: os níveis de despesas de capital ainda são modestos. Para os analistas, isso sugere cautela entre as equipes executivas e os conselhos em relação ao crescimento impulsionado por projetos de capital de grande escala. “O mesmo vale para as fusões e aquisições (M&A): embora tenham ocorrido várias grandes transações no setor de ouro, por exemplo, os níveis gerais são significativamente mais baixos do que em 2007–12”, cita o documento da consultoria.

Outras informações confirmam a atitude de cautela. As empresas reduziram os dividendos após 2011, quando os preços das commodities começaram a cair. De acordo com os analistas, em 2017, quando os fluxos de caixa começaram a melhorar com os preços das commodities, os dividendos e as recompras de ações começaram a aumentar novamente – e atingiram níveis máximos em 2019. Isso teria ajudado as empresas a economizar dinheiro no momento do déficit e priorizar outros usos de dinheiro. A atitude das mineradoras destoou, por exemplo, de outras indústrias, como petróleo e gás, que decidiram manter os níveis de dividendos apesar de uma redução nos preços do petróleo após 2014.

Por fim, o novo ciclo, ou seja, um novo aumento de fluxo de caixa sem precedentes nos próximos dois anos, pode ter alguns desdobramentos. Para se preparar para o próximo ciclo, as empresas devem considerar ajustar suas estratégias, capacidades e mentalidades. Alguns prováveis caminhos indicam uma retomada de novos projetos em contraponto a investir em novos. A sustentabilidade também vai pegar forte, pois “investidores e os mercados financeiros estão exigindo cada vez mais uma abordagem de crescimento que considere fatores ambientais, sociais e de governança (ESG)”, avaliam os analistas.