É para custar menos ou vender mais?

Por Eduardo Amaral – 04.11.2016 – 

Artigo de estreia do colunista do Infraroi discute os reflexos da compra da Time Warner pela AT&T e como a negociação muda o cenário de redes e de conteúdo, de telecomunicações e de mídia. 

 

O Rei Despido

Um solavanco de proporções tsunâmicas no segmento de tecnologia: o proto-monopólio, desmembrado e refeito como uma fênix, que hoje atende pelo antigo nome de AT&T, compra o conglomerado Time Warner, imediatamente se transformando em um organismo nunca antes visto na história das telecomunicações e mídia. De agora em diante, a AT&T controla gigantes do jornalismo e entretenimento como CNN e HBO, respectivamente. A despeito do pioneirismo, as repercussões e reflexões que o movimento desperta no mercado, devem tirar o sono de executivos e investidores por um bom tempo.

Regulação vs Liberdade

Frente à ameaça das OTTs, qual deveria ser o limite para as telcos se reinventarem? Muitos, se olharmos para os contratos de concessão e normas regulatórias a que estão submetidas as principais operadoras do mercado nacional. Um movimento como o da AT&T, buscando a saída clássica do conteúdo como fator fidelizador para serviços de telecom, é atualmente impensável no Brasil. O que parece ser varrido para debaixo do tapete é o questionamento sobre o suposto benefício dessas normas para o consumidor. Será que o cidadão americano tem a perder com fusões e aquisições dessa ordem? Ou seria um desserviço o controle estatal e a tentativa artificial de compartimentar ofertas e prever o rumo que o segmento terá, influenciando os resultados operacionais e a criatividade competitiva? Enquanto isso, as operadoras nacionais seguem no gingado, esquivando-se como podem da concorrência inovadora e, quase sempre, desregulamentada.

Dosimetria da Transformação

Projetos transformacionais estiveram na vitrine de praticamente todas as telcos nos últimos 10-15 anos. Apesar do forte apelo e dos fins muito justificáveis, o nível de sucesso tem sido muito menor do que o esperado. As realidades se impõem e a fórmula mágica «construir uma casa nova e abandonar a velha» se mostrou extremamente complexa. Há quem impute culpa à legislação contábil-fiscal em terra brasilis, ao modo latino-brasileiro de conduzir grandes projetos, à inflexibilidade dos SW internacionais… No entanto, poucos desses projetos respondiam claramente a questão original apresentada como mote da nossa coluna: afinal, é para custar menos ou vender mais?

Servindo a dois senhores

Se consultados, 10 em 10 executivos provavelmente dirão que precisam de ambos: diminuir OPEX e inovar para conseguir bater a concorrência, seja ela oficial ou da nova start-up promissora da última semana. Aliar os dois objetivos é normalmente o grande desafio arquitetônico: conjugar entregas rápidas, auxiliando o balanço da operadora, com a implementação das mudanças necessárias no âmbito de BSS/OSS para suportar as novas ofertas que trarão fôlego competitivo. E é nesse ponto que começa a angústia – como faturar mais, com inovação continuada para manter a tendência positiva, usando menos subsídio e meios de comunicação/atendimento relativamente baratos? Deve ser ponto pacífico que não vale transformar a operação e o aparato tecnológico para continuar vendendo pacote de R$40 para 1Gb de dados e 200 minutos locais. Infelizmente, a regulação impõe barreiras importantes à criatividade dos gestores de produto e marketing das operadoras, especialmente quando se fala em mimetismos com o mercado bancário e temas relativos à privacidade ou localização. Isso sem contar com as limitações de ofertas para o mercado empresarial. Quer um exemplo? Tente contratar um IP Trunking para simplificar/baratear o SAC da sua empresa.

Voltando ao stack BSS/OSS, apesar das metodologias modernas de desenvolvimento rápido de SW, muitos dos projetos transformacionais ainda seguem o modelo clássico de entregas periódicas. Com o decorrer do tempo, o requerimento original, supostamente bem especificado, acaba por ter que evoluir para se adequar a movimentos concorrenciais, o que complica o planejamento das entregas e faz com que os projetos atrasem ou não terminem satisfatoriamente. Um exemplo clássico é o caso da Vodafone UK e as recentes críticas recebidas. Projetos que deveriam durar meses seguem por anos a fio, sem uma perspectiva minimamente crível de que chegarão ao fim. E o inferno se estabelece: mais um sistema de CRM, outro billing, onde fica o catálogo master de produtos? E o cliente duplicado no stack novo e ainda presente no antigo…

Nos próximos artigos, traremos uma análise sobre alguns projetos sintomáticos em território nacional, fazendo um paralelo com a dicotomia original da coluna. Também analisaremos a transformação no âmbito da engenharia de telecomunicações, com o advento do NFV e o racional da evolução ao 5G. Por fim, faremos uma análise sobre a necessária mudança de paradigma com respeito ao relacionamento de clientes.

Até breve!

Eduardo Amaral é sócio-diretor da Kaena.