Projetos de qualidade ainda são um problema em saneamento

Por Nelson Valêncio – 06.12.2017 –

Segundo Renato Sucupira, presidente da BF Capital, maior rotina dos investidores privados no setor é a procura por bons empreendimentos

Renato Sucupira presidente da BF Capital

A originação de projetos no segmento de saneamento, ou seja, a preparação dos empreendimentos públicos para serem licitados, é um desafio para a privatização do setor. Como agente “desestatizante”, o BNDES tem a responsabilidade de preparar concessionárias de nove estados para o processo, o que pode levar a investimentos entre R$ 5 bilhões e R$ 10 bilhões cada, tirando saneamento do cargo de patinho feio entre as concessionárias de serviço público no Brasil. O problema aqui é o verbo poder. Para Renato Sucupira, presidente da BF Capital e ex-funcionário do BNDES por mais de 15 anos, não falta dinheiro e sim bons projetos.

“É preciso entender que não estamos falando de privatização como aconteceu com a CSN no passado e sim de passar o serviço para o segmento privado”, argumenta. Sucupira, a passagem das concessionárias – em função do modelo jurídico atual, que envolve estados e municípios, vai além das discussões financeiras e de engenharia. “O modelo poderá ser uma cisão de parte da empresa ou subconcessão ou subdelegação, entre outras”, diz. “Juridicamente é mais complexo”, complementa.

No entendimento do especialista, a vontade política é outro determinante forte do processo, uma vez que sem ela os projetos não vão avançar e não haverá segurança jurídica, principalmente porque muitos empreendimentos poderão ter a data de licitação em 2018, ano eleitoral. O ideal, segundo Sucupira seria tratar os projetos como de estado e não de governo, desvinculando-os do cronograma eleitoral e atraindo mais investidores estrangeiros. Bom, mas antes disso é preciso ter projetos que fiquem em pé técnica e financeiramente. Como conseguir isso?

Para Sucupira, o processo começa com os chamados PMI, procedimentos de manifestação de interesse, bem estruturados e preferencialmente feitos por uma instituição neutra que não participe da licitação, evitando a assimetria de informações. O presidente lembra que a movimentação trazida pela Lava Jato, influenciando a adoção de mecanismos de transparência coloca em cheque muitas empresas que querem participar da licitação, mas não das PMIs. “Como o governo tem limitação técnica, financeira e de pessoal para realizar as PMIs, isso não ajuda na criação de bons projetos”, avalia.

Uma alternativa na avaliação do presidente da BF Capital – ela mesma contratada para elaborar estudos que subsidiam as PMIs – é a criação de um funding de investidores que encomendem os estudos a uma consultoria neutra. “Dinheiro não é problema, mas é preciso transparência”. Outra opção é o modelo recém-desenhado pela Secretaria da Aviação Civil, que licitou quatro aeroportos contratando o serviço da BF Capital. A consultoria só foi paga – depois da assinatura do contrato pelo vencedor, pois uma das cláusulas era exatamente essa: o pagamento da empresa responsável pelo estudo baseado na PMI do projeto.

A participação de agências multilaterais de financiamento, caso do IFC, do Banco Mundial, é outro exemplo. Elas podem contratar os estudos dentro de sua estrutura financeira para viabilizar o projeto, aliviando os governos dessa demanda. Além de falta de recursos, o setor público ainda amarga a desconfiança de confundir uma iniciativa de governo com a de estado. Os prazos curtos também pesam negativamente, na avaliação de Sucupira. Para ele, se o problema não for equacionado, o Brasil continuará a ter o sexto maior mercado mundial em volume de projetos de infraestrutura e a ocupar a desonrosa colocação 123 – em termos de qualidade de infraestrutura – num grupo de 140 países.

O presidente da BF Capital, Renato Sucupira, foi um dos palestrantes do II Fórum Concessões em Saneamento – Investimentos, Nova Modelagem e Riscos, promovido pela Conceito Seminários Corporativos em São Paulo na semana passada.