O que já é ruim pode ficar pior na greve dos caminhoneiros

Da Redação – 29.05.2018 –

Ambientalistas chamam a atenção para a necessidade de o país repensar a dependência de combustíveis fósseis

Se em 2013 as manifestações para a redução de tarifas de transporte público mobilizaram o país, a greve atual dos caminhoneiros – com ou sem locaute – está trazendo vários questionamentos. O primeiro e mais óbvio é o perigo da dependência excessiva dos combustíveis fósseis para a segurança nacional.

“É muito oportuno se discutir a eletrificação do sistema de transporte brasileiro. Quase 15% de toda carga transportada no Brasil é o próprio combustível que viaja milhares de quilômetros para chegar aos postos para abastecer os veículos”, explica Tasso Azevedo, coordenador do Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG).

De acordo com ele, se o Brasil adotasse um sistema de transporte baseado em eletricidade, o problema desapareceria, pois a energia circula pelo sistema integrado de energia elétrica. “Postos de recarga podem ser instalados de forma rápida em qualquer lugar e, ainda, serem carregados com energia solar no local. Embora o investimento inicial seja alto, os custos de operação dos veículos elétricos são muito mais baixos”, complementa.

Para o especialista, porém, a eletrificação do transporte tem sido solenemente ignorada nas politicas de transporte, mobilidade e desenvolvimento da indústria automobilística no Brasil.

Brasil depende de transporte rodoviário, que é perdulário

Os últimos movimentos para mudar a dependência foram organizados há décadas. Trata-se do Proálcool, criado há 40 anos, e do programa de incentivo da produção e do uso de biodiesel há dez. O resultado é que mais de 80% da energia que movimenta nosso sistema de transportes ainda é de origem fóssil: gasolina, querosene de aviação e óleo diesel.

Para André Ferreira, do Instituto de Energia e Ambiente, a dependência do transporte rodoviário é outro problema grave: para transportar uma tonelada de carga útil por 100 quilômetros, os caminhões gastam – no Brasil – 2,3 litros de diesel, enquanto os trens gastam 0,4 litros e os navios 0,3 litros.29

Pode piorar? No Brasil, sempre: entre os países de grandes dimensões, somos o mais depende dos caminhões. Aqui eles respondem por 65% da carga transportada, enquanto na Austrália respondem por 53%, na China por 50%, no Canadá por 43%, nos EUA por 32% e, na Rússia por somente 8% (em tkm).

Política de preços da Petrobras piorou o processo

Carlos Rittl, do Observatório do Clima, diz que “o Brasil parece se esforçar demais para chegar atrasado no futuro. Enquanto vemos avançar mundo afora trens e caminhões com energia solar, internet das coisas e blockchain na logística de transportes, entre outras inovações, governo e políticos se restringem a discutir o preço e os subsídios aos combustíveis fósseis”, resume.

Para colocar mais diesel na questão, a política de preços da Petrobras certamente tem papel na crise atual. Ao tentar corrigir o subsídio excessivo dado pelo governo anterior adotando como baliza os preços do petróleo no mercado internacional – e não sua planilha de custos -, a empresa criou uma situação difícil de administrar para aqueles que têm nos combustíveis fósseis um insumo essencial.

Para Rachel Biderman, do WRI Brasil, “além dos preços abusivos, estamos reféns também da falta de uma política energética focada nas energias renováveis, perdendo na competição com outras economias emergentes que já aderiram às mesmas em combate às mudanças climáticas”. Ponto.