A mineração tem futuro?

Nelson Valêncio – 01.03.2019 – Sim. E vou explicar o porquê. Não podemos viver sem nossos aparelhos eletrônicos móveis, principalmente os smartphones. E o que faz eles funcionarem? As baterias de íons de lítio, porque é a tecnologia que ainda combina viabilidade econômica e tecnológica. Olhe à sua volta e veja o desespero das pessoas em aeroportos e rodoviárias: todo mundo em busca de uma tomada. A tomada atualmente nos define antropologicamente. Também não podemos ficar sem nossas casas. E elas são – em sua maioria – feitas de concreto, uma mistura básica de areia, brita, ou seja, pedra britada, água e aditivos. Só dois exemplos – extremos – e ponto.

A mineração tem futuro, mas esse futuro passa pela adequação do setor às regras ambientais cada vez mais restritivas. E faz muito sentido que seja assim. Para nós, brasileiros, nem é preciso explicar. Estamos vivendo uma tragédia que poderia ser evitada e que afetou profundamente a percepção a respeito das atividades minerais. Portanto, mineração sem responsabilidade social e ambiental é um negócio fadado ao fracasso. Daí as inúmeras pesquisas para desenvolver processamentos que reduzam água e energia, entre outras iniciativas.

Britadores africanos já vem sendo monitorados da Europa 

Algumas das respostas residem na tecnologia e, por incrível que pareça, a mineração tem avançado nisso, apesar de ser uma atividade milenar. Há exemplos de britadores operando em lugares remotos da África e que são monitorados da Europa. O monitoramento é possível porque os equipamentos têm inúmeros sensores embarcados e esses sensores enviam dados via satélite para uma nuvem. A nuvem, na verdade um servidor físico em outro lugar, permite  o compartilhamento das informações. Então, a receita do bolo envolve sensores, um acesso de rede satelital e pronto. O preço dos sensores e do acesso das redes satelitais vem caindo, o que viabiliza o processo. Sem viabilidade econômica, já sabemos que não funciona.

O monitoramento da mina até o despacho no porto ou na ferrovia, ou ambos, é uma das pegadas do futuro da mineração. O processo já acontece, mas a diferença é que ele será ampliado e vai acontecer cada vez mais em tempo real. Tags eletrônicas rastreiam o minério desde a cava até o processamento. Sim, é uma tecnologia real. Como isso influi no meio ambiente? Básico: se o gestor da planta de processamento mineral sabe o tipo de minério que vai processar, ele pode ajustar seu britador, por exemplo, para um modo de uso de energia mais eficiente, ou ainda refinar processos que usem a água para retirar o minério, reduzindo o volume necessário de acordo com o tipo de minério.

Estocagem de vento depende hoje de baterias de íons de lítio

Mais do que isso: o sistema em si pode fazer tais ajustes, porque vai trabalhar de forma integrada. Vendo de outro ângulo, o sensoriamento pode antever falhas em equipamentos, evitando o desperdício de recursos minerais. É uma visão otimista, quase polianesca, dirão alguns. Pode ser. Eu mesmo, no entanto, vi o lançamento das “maquininhas” de pagamento com cartão e, na época, pensei comigo que isso nunca iria ser viável. Quem iria confiar o cartão a um estranho num bar e ainda digitar a senha? Pois é, não só funciona – o processo, visto que a rede nem sempre é católica – como não conseguimos pensar em outra forma de pagamento. Aliás, conseguimos: via celular direto, via outros tipos de dispositivos móveis, logo por biometria como acontece nos caixas automáticos…

Ouvimos uma ex-presidente falar em estocagem de vento e muitos de nós demos risada. Mas não só é possível como também acontece. E uma das opções é o armazenamento em baterias que funcionam, entre outros, com os íons de lítio. Mineração de novo. E com futuro. O consultor norte-americano George Hemingway, do Stratalis Group, lembra que a conversa não é sobre o futuro da mineração e sim sobre o futuro dos metais. Eles vão permanecer. O lítio, o cobalto e tantos outros. Pense nas ligas mais avançadas usadas na indústria aeronáutica. O que pode mudar é o conceito de mineradora. A Apple, por exemplo, que tem um plano de reciclar todos os metais de seus aparelhos (não disse até quando) não tem mina, não tem planta de processamento, mas de uma maneira singular poderá ser uma mineradora do futuro. Ou não?