Cidades brasileiras batem de frente com Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) nos gastos com pessoal

Da redação – 09.06.2016 – 

Goiânia e Salvador são as duas únicas capitais que puxaram o freio em 2014, na avaliação da pesquisa. Petrópolis e Viamão entram na lista vermelha. Relatório traz ainda dados de 2015 e faz um raio-X dos orçamentos dos municípios.

Se a mesma base legal que levou à abertura do processo de impeachment da presidente Dilma Roussef for aplicado à gestão dos municípios brasileiros, o cenário não será nada animador. De acordo com o anuário Multi Cidades – Finanças dos Municípios do Brasil, lançado pela Frente Nacional de Prefeitos (FNP) em parceria com a Aequus Consultoria, os gastos com pessoal, em 2014, ultrapassaram o limite máximo de comprometimento estipulado pela LRF.

Apesar do gap de quase dois anos, os dados do levantamento são os mais recentes e indicam um total de R$ 224,2 bilhões gastos com a folha de pagamento dos servidores ativos, inativos, pensionistas e os encargos trabalhistas. O montante representa um aumento de praticamente 6% em relação aos R$ 211,9 bilhões de 2013. Dentre as capitais, somente Goiânia, que reduziu seus gastos com a folha em 9,5%, e Salvador, que diminuiu em 3%, destoam do perfil mais gastador. Se a série histórica for analisada, o problema torna-se ainda mais grave, pois desde 2012 há uma tendência de aumento de custos com pessoal.

Goiânia puxou o freio em 2014 e reduziu gasto com folha em 9,5%.
Goiânia puxou o freio em 2014 e reduziu gasto com folha em 9,5%, seguindo alerta do ano anterior. 

E como ficou o desempenho em 2015?

O anuário também analisa os dados de 2015 tomando por base o site Compara Brasil (www.comparabrasil.com) para 18 capitais brasileiras, que possui informações de 2013, 2014 e 2015, excluindo-se São Paulo. A avaliação mostra que o gasto com pessoal do poder executivo ficou praticamente no mesmo nível de 2014, com variação de apenas 0,1%, considerando valores corrigidos da inflação.

“Essa diferença mínima reflete o esforço dessas cidades em segurar a despesa com pessoal. No entanto, a receita corrente líquida dessas capitais sofreu uma queda de 2,6%”, analisou o economista Alberto Borges, editor do anuário Multi Cidades.

Para ele, os dados indicam que a despesa com pessoal, o maior item do gasto municipal, não acompanhou o desempenho da receita também em 2015. E mais: as prefeituras ficam cada vez mais próximas do limite máximo de comprometimento da receita corrente líquida com a despesa de pessoal permitido pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que é de 54% para o Poder Executivo.

Das 18 capitais com dados disponibilizados pelo Compara Brasil, duas ultrapassaram o limite máximo em 2015: Natal, com 56,4%, e São Luís, com 55,2%. Outras duas estão acima do limite prudencial: João Pessoa, com 53,4%, e Campo Grande, com 53,2%. E outras três ficaram acima do limite de alerta: Maceió (50,9%), Porto Velho (50,7%) e Recife (49,7%). Em 2014, nenhuma capital havia ultrapassado o limite máximo.

Quem gasta mais do que pode ou do que seria prudente gastar

Voltando aos números de dois anos atrás, o anuário mostra que a taxa média de crescimento das despesas com pessoal foi de 5,5% nas capitais. Lembrando que somente Goiânia e Salvador apertaram os cintos, principalmente a primeira, pois já tinha ultrapassado o sinal vermelho da LRF em 2013.

Fora das capitais, alguns municípios estão brincando com fogo. É o caso de Petrópolis, que puxa a fila com um aumento de 39% no gasto com a folha em 2014, e Viamão, com 27%. A lista de quem gosta de viver perigosamente inclui ainda Joinville (25,7%), Ananindeua (24,7%), Olinda (24,7%), Blumenau (23,8%), São Luís (23%) e Cascavel (20,3%). Há quem trabalhe no sentido oposto, incluindo a campeã Mogi das Cruzes (-23,1%), além de Várzea Grande (-21,4%), Goiânia (-9,4%) e Carapicuíba (-7,8%).

Bonitinha, mas gastadora: Petropólis ocupa o topo da lista de 2014.
Bonitinha, mas gastadora: Petropólis ocupa o topo da lista de 2014, segundo anuário Multi Cidades. 

Para Alberto Borges inúmeros fatores explicam o crescimento das despesas com pessoal, como a política de valorização do salário mínimo nacional, o crescimento vegetativo da folha de pagamentos, a correção do piso salarial dos profissionais do magistério e o aumento do número de servidores.

“Entre 2009 e 2014, o número de servidores aumentou 15,3% (passando de 5,5 milhões para 6,3 milhões), ao passo que a despesa com pessoal cresceu 40,2%. Esses números demonstram que o aumento do quantitativo de servidores explica apenas em parte o aumento do gasto com pessoal, que sofre grande interferência dos demais fatores, como aumento do salário mínimo, correção do piso do Magistério e o crescimento vegetativo da folha”, ressaltou.

Conforme o anuário, o aumento dos gastos com pessoal em um cenário de crescimento mais lento das receitas fez com que o peso na receita corrente para o agregado dos municípios brasileiros continuasse sua trajetória de elevação, chegando a 48,8%, em 2014.

“A fatia da receita corrente destinada à folha de pagamento de pessoal tende a ser maior nas regiões de menor desenvolvimento econômico por terem orçamentos mais enxutos, como no Norte e no Nordeste. Com menos receita e com a necessidade de um quadro mínimo de funcionários para gerir a máquina pública, a folha pesa mais para as cidades em regiões economicamente menos desenvolvidas”, avalia o economista.