O ano que não acabou

Nelson Valêncio – 14.12.2020 –

Estamos chegando ao fim de 2020, mas o ano não vai acabar no dia 31 de dezembro. Ele vai além. Enquanto a pandemia não for controlada e, espero, vencida, ainda vamos viver esse desassossego diário. Tendo sido infectado pelo coronavírus, posso confirmar que a Covid-19 está longe de ser uma gripezinha. Como tantos brasileiros, vivi a morte em família por causa da doença e me deprime ver como o país “gerencia” a questão. Qualquer pessoa sensata sabe que o Brasil está desgovernado, para dizer o mínimo.

A miopia é tamanha que um dos poucos ministérios realmente eficientes tem pouca ou quase nenhuma visibilidade. Falo do Ministério da Infraestrutura, liderado de fato – e não de ficção – pelo ministro Tarcísio de Freitas. Trata-se de um profissional que teve passagem pelos governos anteriores, inclusive politicamente antagônicos ao desgoverno atual. É importante refletirmos sobre isso, sobre o fato de ser um profissional que vê a infraestrutura como uma política de estado e não de governo. Faz falta para nós, como brasileiros, tal visão.

A mesma miopia levou muitos a buscar heróis que não fizeram outra coisa senão nos levar ao estado de coisas atuais. Falo especificamente de um deles, o ex-juiz e o ex-ministro Sérgio Moro. A operação Lava Jato, no formato que assumiu, praticamente destruiu um conjunto de grandes construtoras e levou milhares ao desemprego. Por que as empresas foram punidas – juntas com seus colaboradores – e não e tão somente os dirigentes à frente do processo de corrupção? Alguém imagina os Estados Unidos ou a Alemanha, para ficar em dois exemplos, destruindo suas empresas dessa forma?

É evidente que somos a favor da transparência, do combate à corrupção. Ninguém é insano de ser contra isso. O que não podemos ser é contra o próprio país. A pergunta que fica: depois de estar à frente de um projeto anticorrupção durante tantos anos e mirar na engenharia brasileira, por que o ex-juiz e ex-ministro foi entrar no mercado privado justamente defendendo as mesmas empresas que condenou? É moralmente indefensável.

Como jornalista conheci de perto vários profissionais do grupo das grandes construtoras. Eu os vi trabalhando em campo. Engenheiros, técnicos de primeiro nível. Por que eles foram punidos, numa vala comum, quando seria lógico colocar na cadeia quem de fato assumiu o risco da corrupção? Por que a insanidade de destruir toda uma cadeia? Não fez e nem faz sentido.

No movimento de contracorrente vemos um ministro da Infraestrutura realizando um trabalho consistente e sério, retomando obras que precisariam ser retomadas e que foram mapeadas na sua viabilidade. Vemos um programa de concessões que avança, discreto, mas de forma continuada. Há um projeto de construção de país nesse caso. Há uma lógica e uma visão que ultrapassa o desgoverno atual.

A pergunta que eu faço é a de qual Brasil gostaria de ter. Um país de “heróis” de papelão, onde reina a incompetência, ou um Brasil de homens comuns, reais e comprometidos com um projeto de país. Independente de ideologias, minha escolha é a segunda.