Briga de ISPs por “Megas” é canibalização de mercado

João Monteiro – 20.10.2022 – Especialistas explicam que oferta de muitos megas pode matar mercado futuro e competição nesses termos é um risco

O painel “M&A: os ISPs são a bola da vez?” promovido hoje (19/10) na Futurecom 2022 expôs os riscos de uma estratégia baseada na oferta de muita velocidade para clientes que não a consomem. A premissa é simples: o provedor de Internet (ISP) oferece planos com velocidades maiores por preços menores que a concorrência. Hoje, isso é viável porque a maioria dos consumidores não precisa de tanta velocidade assim, então acaba consumindo bem menos do que o estipulado no plano.

No futuro, porém isso pode mudar. Gabriel Codo, especialista no setor da McKinsey, explica que esse tipo de oferta vai matar o mercado quando vídeos em 4K ou até qualidades superiores começarem a ter mais demanda. “Hoje, para o ISP, custa a mesma coisa oferecer 100 Mega ou 1 Giga, porque o usuário não usa mais que 100 Mega. O problema é que no longo prazo impacta a sustentabilidade, porque o consumidor vai precisar de mais banda no futuro, com o metaverso”, destaca.

Dessa forma, quando o cliente precisar de bandas maiores, o custo baixo já vai estar estabelecido e o retorno para os ISPs vai ser baixo.”Há o risco de esgotar o limite da banda à toa, canibalizando o negócio”, afirma Eduardo Parajo, vice-presidente da Abranet. Segundo ele, pode acontecer o mesmo que houve durante a pandemia, quando o tráfego de Internet aumentou tanto que os ISPs tiveram que correr para aumentar sua capacidade.

Competição de mercado é problemática

Outro problema é a competição de mercado que, na visão dos painelistas, é insustentável. Codo, da McKinsey, diz que mercados competitivos fora do país, como Barcelona (Espanha), tem cerca de três operadoras fixas competindo na mesma região. “No Brasil, cidades médias têm cinco”, afirma. Esse excesso de competição pode causar canibalização da rentabilidade do negócio, já que não há tantos clientes disponíveis assim.

Parajo, da Abranet, diz que esse modelo precisa mudar e que os provedores precisam se abrir para o compartilhamento de fibra óptica para racionalizar o investimento em infraestrutura. Por mais que pareça uma forma de ceder o mercado para a concorrência, também é uma forma de se rentabilizar a infraestrutura já implementada, locando parte da rede e tornando seu uso mais sustentável.

Outra forma que esse mercado encontra é a consolidação. A compra e fusão de provedores até arrefeceu, mas o VP da Abranet diz que elas ainda ocorrem entre médios e pequenos. Segundo ele, foram ao menos 80 transações desse porte em 2021, fazendo que ISPs médios ganhassem mais relevância em sua região, o que pode aumentar o interesse da aquisição deles por grandes provedores.

Fundos internacionais

Já a participação de fundos internacionais no mercado de fibra óptica não é algo que os painelistas enxergam acontecendo. Isso porque o investimento internacional busca ativos “mais monopolizados”, diz Codo, como rodovias e aeroportos, empreendimentos em que não há concorrência direta.

Além disso, tem as questões burocráticas – impostos e o compartilhamento de postes – e, por fim, o retorno financeiro, já que o ARPU não é tão grande assim. “A receita de todo o segmento no Brasil é igual a de um dos estados dos Estados Unidos”, destaca o especialista da McKinsey.

Parajo até vê investimentos estrangeiros pontuais no setor nacional, mas sempre com um executivo brasileiro que entende o mercado na frente.